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Há tempos que venho falando sobre a indústria 4.0, e vou falar até ficar rouco. Os impactos daquele documento assinado na Alemanha em 2014, com o conselho de ciência e tecnologia e as principais fábricas alemãs, que permitia à indústria voltar ao seu país sem gerar empregos, impacta a todos nos dias de hoje, gerando da indústria 4.0 a educação 4.0 e a sociedade 4.0.
Para quem chegou aqui de paraquedas e não sabe do que estou falando, a união de 8 tecnologias que já eram disruptivas por conta própria criou uma nova indústria. Essas tecnologias são IoT – Internet das Coisas, que coleta e gera a BigData, que a inteligência artificial analisa, que gera insights por Realidade Virtual e/ou ampliada, que é validada por BlockChain, que atualiza a programação de robôs e da industria, aciona Drones, propõe novos protótipos ou produtos feitos à medida por Manufatura aditiva.
Ao gerar uma indústria que não tem funcionários, essa indústria inclusive é chamada de Dark Plants – fábricas escuras, um novo paradigma surge, o que fazer com as pessoas dessas fábricas? Ai entra a nova educação e a nova sociedade.
No Brasil temos o impacto dessas mudanças, seja na saída da Ford do país, a saída da Mercedes de Anápolis, a Join-venture ou fusão da PSA com a FIAT. Ações que enxugam os empregos ou os extinguem. O que fazer com essas pessoas que estavam empregadas? O que fazer com as próximas gerações que vão chegar ao mercado de trabalho, e não há um mercado de trabalho para chegar?
Primeiro, claro que as indústrias ainda vão precisar de funcionários, apenas que cada vez menos funcionários, e cada vez mais multidisciplinares. Para esses empregos, surge no mundo uma nova forma de educação, a STEM/STEAM, e no Brasil, a BNCC. Uma educação baseada em projetos, criando pessoas que sejam multidisciplinares, em busca de preparar essas pessoas a preencherem vagas que ainda não sabemos quais serão elas no futuro.
Em segundo lugar, a sociedade tem se tornado cada vez mais uma sociedade de serviços, não como nos anos 80 – a chamada década perdida – onde um projeto de reabertura de mercado mal feita encontrou uma indústria atrasada, e temos o famoso caso de ‘o engenheiro que virou suco’, onde a única oferta de trabalho era servir lanches nas portas das fábricas que sobraram. Hoje existe o conceito da economia laranja, já falei dela aqui, mas em resumo a economia laranja é todo o dinheiro gerado sem passar por indústria, é a moça que sem conseguir dormir, decide fazer um joguinho de madrugada e publica na plataforma mundial de aplicativos, ativa a opção patrocínio, e faz 30.000 dólares entre anúncios e vendas de versões pagas do dito joguinho, em 3 meses.
Seja publicando jogos, livros, vendendo projetos em 3D, imprimindo desde o fundo do quintal, todo dinheiro que é feito direto do produtor ao consumidor, sem fronteiras, é chamado de economia laranja. Não há empresas,contadores, nota fiscal, impostos, só há a ponte /entre o produtor e o consumidor. Do criador do jogo Flap Birds a clássicos instantâneos de auto publicações. E claro, Youtubers e podcasters. E esse movimento deve acelerar. Muito.
Aqui entra por exemplo, o Patreon, a plataforma de suporte financeiro pelos fãs à produtores de conteúdo. Ainda pequeno no Brasil, pois pouca gente sabe como receber dinheiro de plataformas internacionais – usando PayPal ou Payoneer por exemplo – mas um gigante mundial assim mesmo. Com certeza, se você assiste aos YouTubers gringos, já deve ter ouvido falar de Patreon.
Patreon teve uma avaliação financeira que foi, em apenas seis meses de 1,4 bilhão de dólares, para 4 bilhões de dólares. E o motivo é ver que todas as plataformas estão copiando eles!
Twitter lá fora lançou o Super Followers, Facebook lançou o Fan Subscription e o YouTube tem o Members. E não é só isso, o próprio Patreon tem seus concorrentes, com o apelo de serem multiplataformas. Quem desenha ou escreve pode publicar e vender pela Gunroad, produtores do Vimeo, poem usar o Fullscreen. TikTok auncionou 4 bilhoes em fundos para financiar e impulsionar criadores.
O Brasil tem a Vakinha e Catarse, que não é a mesma coisa que um financiamento recorrente de baixos valores, mas que se aproxima do conceito. Tem ainda o Padrim, um Patreon brasileiro, com ainda menos sucesso. Mas o fato é que existem plataformas vendo esse movimento de transformação, e vale lembrar, o Jovem Nerd com o financiamento coletivo de produtos derivados de seu podcast grátis, baseado nos contos de H.P.Lovecraft, Call of cthulhu, levantou 8 milhões de reais e se tornou o maior financiamento coletivo da América Latina. Em plena pandemia.
Para auxiliar esses criadores a migrarem de indivíduos à empresas, plataformas de CRM, ERP, SCM, antes voltadas para empresas, lançaram módulos específicos para este público de pessoas físicas. Jack, criador do Patreon, chama esse movimento de Lego-lização de plataformas. Antes, para um criador virar empresa, ele tinha que fazer o site, ter um contador, montar plataformas de atendimento. Hoje a AWS faz hospedagem facilitada, SalesForce tem módulos para pessoas físicas, ZenDesk facilitou a gestão de tarefas. Temos YouTubers hoje com equipes completas, entre editores, área comercial, suporte e atendimento aos fãs.
Existe um movimento criativo que está se auto alimentando, e se acelerando. Segundo um estudo da OCDE – Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Econômico, 75% dos jovens de 10 a 16 anos dos Estados Unidos e Europa querem, hoje, serem produtos de conteúdo quando crescer. Pessoas que já nasceram em meio a essa transformação, e que vêm com naturalidade, alguém viver disso, do conteúdo que produz.
Mas não é só ser produtor de conteúdo, essas plataformas dão espaço para quem fabrica e vende, sem sair de casa. Plataformas de venda ancoradas no Instagram, mensagens automáticas e fáceis de configurar por Whatsapp e Whatsapp Business, página comercial hospedada no Facebook.
Finalmente, em 5 anos, podemos ver uma mudança cultural, onde o estígma do criador morto de fome pode terminar. E ser um autônomo criador de conteúdo pode ser uma das profissões futuras tão normais quanto ser professor, advogado, engenheiro o médico.
Ricardo Cavalline falou em um podcast recente da MIT Sloan Review Brasil como influencers estão se tornando suas próprias empresas. Jaden Smith, filho do Will Smith, criou uma empresa de águas sustentáveis, com garrafas plásticas feitas 100% de material reciclado, com captação responsável. Ele usou seu poder de celebridade para empreender. O irmão do Cavalline, que é especializado em materiais de sobrevivência na selva, decidiu virar sócio das empresas que o contrataram para anunciar produtos em seu canal. Ele não apenas recomenda, ele os vende. Uma bloggueira de maquiagem, Nativoga ou algo assim, acaba de ter sua empresa comprada por 200 milhões de reais. O que ela fazia? Escolhia a dedo produtos desconhecidos no mercado brasileiro e os trazia com sua própria marca. E tem o Jovem Nerd que já citamos. Se você acha que esse tipo de coisa só acontece lá fora, isso é o chamado O Poder do Exemplo – ver que seu vizinho conseguiu, que aquela celebridade web conseguiu, nos faz acreditar que também conseguiremos.
Transformações são lentas no Brasil, e nesse ponto, graças à COVID, o Brasil viveu 20 anos de transformação digital em 1 ano, apresentando de velhinhas à pessoas informais ferramentas digitais. Começaram com uma obrigação, atender à uma aula, sacar o auxílio emergencial, mas terminou por apresentar a internet à milhões de pessoas, que descobriram que podem comprar online, que podem vender online, e que podem produzir conteúdo, online. Desde essa gente maluca que fica dançando funk nos comerciais do TikTok antes do video que você quer ver no YouTube, aos outros malucos fazendo vídeos toscos, de propósito, no Kwai.
No final, o desemprego desencadeado pela pandemia, que potencializou o desemprego da Indústria 4.0, pode ter rompido a tranquilidade de quem só queria entrar as 8 e sair às 17, de segunda a sexta, mas abriu as portas para milhões de pessoas virarem seus próprios patrões, gerarem renda, produzindo algo, gerarem empregos e novas indústrias, com novas ideias.
Existe esse conceito enganoso que produzir produtos ou conteúdo online é como o de um restaurante de uma cidade pequena. Se a cidade tem 500 pessoas, o restaurante pode atender 500 refeições por dia, mas que conforme novos restaurantes abrem, o público potencial de cada um fica menor, pois as pessoas só comem 3 refeições por dia. Para a internet, esse exemplo é errado. Pois ninguém assiste a um canal de youtube sobre algo que gosta apenas. Nem ouve só um podcast por semana. Os públicos se cruzam, e um estudo do próprio Patreon mostrou que entre seus inscritos, cada colaboração gerou mais renda para as duas partes que se uniram, ao invés de fazer uma perder público para outra.
Já vivemos um paradoxo dos novos tempos, se antes a expressão para alguém famoso em um mercado de nicho era ‘o famoso quem?’ hoje já existem podcasters e youtubers com 2, 3 milhões de seguidores, e que você nunca ouviu falar. Se no passada alguém era famoso ou não era. Ou era da novela da Globo ou era um anônimo, a internet já fez transformações incríveis, quer você acredite nelas ou não.